Ame e deixe Morrer

Deixo neste blog matéria publicada no "O Povo", artigo opinativo que fala a respeito da necessidade da implementação dos cuidados paliativos e, de certa forma, da disseminação de uma educação para a morte. Este artigo é de particular interesse para profissionais médicos. Parabéns a Pedro Henrique Saraiva Leão pela Inciativa Ame e deixe Morrer Aparente paradoxo - mas convenhamos - eliminar o sofrimento de um ente querido é um ato de amor! Senão consideremos estes três casos: 1 - Doente terminal, 32 anos, câncer de pâncreas e metástases, tem parada cardíaca; reanimado na UTI é ligado ao respirador artificial. Sobreveio falência renal, e foi submetido à hemodiálise; 2-Senhora com 97 anos, insuficiência cardíaca, e coma profundo pós-AVC, internada há seis meses; 3- Paciente com 94 anos, arteriosclerose cerebral, enfisema pulmonar grave, e câncer no fígado. Todos nas caríssimas UTI´s. Prá quê! Só para retardar - com muito sofrimento - sua certa morte! Por muito tempo, o Código de Ética Médica criminalizou a eutanásia, e o Código Penal pode indiciar o médico que a pratica como homicida, impondo-lhe 6-20 anos de prisão. Em 9/11/2007 o Conselho Federal de Medicina aprovou a suspensão de medidas para prolongar a vida de pacientes terminais, incuráveis. Teria sido uma conquista da Medicina brasileira! Mas, sem o apoio da sociedade civil, tal ainda não poupa o profissional da responsabilidade criminal. Modernamente, os religiosos aprovam ações sobre a terminalidade da vida. O clérigo metodista Leslie Weatherhead não entendia a morte como privilégio de Deus, e ponderava: não deixamos o nascimento para Deus, nós o promovemos e até prevenimos! (Revista Time, 19/3/1990). Dom Rafael Cifuentes, da CNBB afirmou:” A vida humana é um dom de Deus, algo sagrado que não podemos tirar, mas para pacientes terminais seu prolongamento pode ser intrrompido” (Revista do Conselho Federal de Medicina, 21/7/2007). Nas faculades de Medicina nos ensinam (e quase obrigam) apenas a curar, mas não a cuidar do paciente! Neste sentido, para cuidar daqueles terminais incuráveis, a médica inglesa Cicely Saunders criou, em Londres (1967) o St. Christopher´s Hospital, o primeiro para cuidados apenas paliativos. No “hospice”, como no “Hospiz” na Alemanha (não confundir com hospício!) prevalece a morte natural (ortotanásia), evitando-se unicamente a dor, e promovendo-se o suporte emocional do paciente e sua família. Em 1970, estas ideias chegaram aos EE.UU, com a psiquiatra suiço-canadense Elizabeth Kübler-Ross, aliás criadora da palavra “Tanatologia”, (do grego “tanatos”: morte), o estudo da morte física, suas repercussões emocionais e do luto. No Ceará (vale lembrado e aplaudido) a Uece foi uma das primeiras a ensinar Tanatologia, há quase 10 anos, no seu Curso de Enfermagem. No Brasil, a paliaçãos destes doentes começou (2002) com a médica Maria Goreti S. Maciel, na Enfermaria de Cuidados Paliativos do Hospital do Servidor Público (São Paulo). Nesses Centros, os paliativistas não mais praticam a “obsessão terapêutica” de tratar tudo. Ali os pacientes morrem porque chegou-lhes a hora, mas se despedem da vida, não seqüestrados numa UTI, com todos os membros perfurados, e penetrados nos seus orifícios naturais, mas com dignidade, confortados pelo amor dos seus, como se morria antigamente, em paz. Pedro Henrique Saraiva Leão - Médico. Presidente da Academia Cearense de Letras ph.saraivaleal@bol.com.br artigo encontrado em O Povo Online

Um comentário:

Ayala Gurgel disse...

Meus parabéns ao dr. Pedro Leão pela coragem de, como médico, se expor perante uma facção hipócrita de nossa sociedade que acredita ser a vida mero somatório de funções orgânicas, confundindo Bios com Zoé.
Nós que fazemos a Sociedade Científica de Estudos e Pesquisa em Tanatologia (www.tanatologia.net) acolhemos essas iniciativas e convidamos a todos para esse debate.
Gostaria de fazer alguns complementos a respeito de sua fala.
A câmara de Bioética do CFM já aprovou resolução reconhecendo os cuidados paliativos como prática médica, cuja matéria, atualmente está sendo discutida nos tribunais superiores em Brasília-DF. Essa comissão conta com profundo apoio da Igreja Católica, na fugura do pe. Leo Pessini, do próprio CFM na figura do seu vice-presidente Roberto D'Ávila e de médicos paliativistas, como a dra. Maria Goretti, entre outros.
Os cuidados paliativos começaram no Brasil a ser praticados no RS e depois em São Paulo, se estendendo atualmente para todas as regiões do Brasil. No mundo, tais cuidados remontam ao final do século XIX, e não a Cicely Saunders, como mostrei em meu livro, Direitos Sociais dos Moribundos. Além disso, o termo Tanatologia foi criado por Feifel, e não por Kübler-Ross. O ensino da Tanatologia no Brasil não começou no CE, mas no RJ com Wilma Torres a quase vinte anos.
Tais informações não desmerecem o artigo do ilustre médico, ao contrário, como é da natureza de todo artigo, abre o diálogo para uma boa conversa.