"Menina de Ouro" e "Mar Adentro": Por que tantos querem a Eutanásia? (Erasmo Ruiz)

Creio que muitos de vocês devem ter visto pelo menos um dos filmes. Boa parte talvez tenha visto os dois. "Menina de Ouro " e "Mar Adentro" são bons filmes. Não vou me delongar numa crítica de cinema pois esse não é o objetivo. Reservadamente posso dizer porque gosto mais de "Mar Adentro" apesar de achar "Menina de Ouro" um ótimo filme

Venho até aqui colocar em discussão não os filmes mas tentar "descobrir" porquê fizeram tanto sucesso. O que os dois tem em comum é a narrativa de indivíduos que lutam para que lhe seja aplicada a eutanásia ativa. Ramon San pedro (personagem de Mar Adentro) parece ter uma postura mais cidadã: quer que seu caso se transforme numa problemática nacional para que uma legislação sobre a eutanásia e o suicício assisitido seja instituída. Na melhor tradição americana, em "Menina de Ouro" o problema social é reduzido a realidade de dois indivíduos onde a garota boxeadora que se tornou tetraplégica implora ao seu treinador que ponha termo a sua vida como um gesto de amor.

Mas o que os dois filmes teriam em comum além da tetraplegia dos personagens e suas lutas pela eutanásia? Durante os dois filmes os espectadores são chamados a compartilhar da dor dos perosnagens. Lá pelo final estamos quase prontos, ao sair do cinema, para entrarmos numa ONG qualquer que lute pela morte digna e pela autonomia irrestrita do ato de morrer.

Os personagens nos convidam a refletir sobre nossas própria vidas. Se estivéssemos vivendo suas condições o que faríamos? Confesso a vocês, talvez me irmanasse a luta deles e quisesse morrer. O problema básico é que, nas condições em que estão, precisam da ajuda de outros seres humanos para tal.

Por que se fala tanto em eutanásia hoje em dia? Uma metáfora interessante seria pensarmos na luta entre dois povos. Um, bem equipado militarmente, o outro, com armamentos de qualidade muito inferior, aquilo que os especialistas militares chama de "guerra assimétrica", onde o mais fraco usa de recursos heterodoxos para enfrentar um adversário muito mais poderoso. O mais fraco será apelidado nos noticiários de "terrorista".

Existe hoje uma guerra de concepções sobre como os homens devem morrer. A hegemônica afirma que nossos corpos devem se disciplinar bem comportados diante dos ditâmes do biopoder, em conlúio direto com aqueles que amamos. Significa dizer que existem indivídiuos que fazem parte um corpo técnico/cultural, os TANATOCRATAS, que quase determinam quando e de que forma iremos morrer.

É a percepção de que sofremos além do limite de nossas possibilidades físicas e mentais que alimenta o desejo pela eutanásia ativa. Para fugir do controle daqueles que nos controlam na hora da morte, parte de nós quer determinar com clareza o momento em que iremos sair do palco desse mundo. A luta pela eutanásia é a luta desigual entre o desespero e as normas que controlam o que "temos" de fazer e passar nesse mundo para morrermos

No entanto, há alternativas diante dessa dicotomia. Se as pessoas vissem desde crianças que existem outras possibilidades de se morrer do que aquelas comumente apresentadas...de que podemos morrer fora de UTIs, de podemos estar nem que parcialmente no controle de nossas ações até o fim...de que existem tecnologias e dispositivos que podem controlar a nossa dor e que equipes de profissionais de saúde podem ser preparados para lidar com nossa morte nos encarando nos olhos e não fugindo das perguntas, então... para que a eutanásia se poderíamos tentar aproveitar a vida até o fim?

Os cuidados paliativos são o melhor antídoto contra a luta desesperada e negadora da vida que a eutanásia inadivertidamente pode representar!

2 comentários:

Anônimo disse...

Compartilho da opinião do professor Erasmo que é o medo da distanasia que nos faz cogitar da eutanasia. Onde o cuidado paliativo for praticado a natureza operará uma morte digna ou uma "boa morte".
elba gomide mochel

Anônimo disse...

Olá, Erasmo e Elba
Compartilho em parte com a opinião exposta.
Em primeiro lugar, concebo eutanásia, suicídio assistido, distanásia e ortotanásia como processos, e não como atos isolados (o momento de aplicação de uma injeção ou de ligar ou desligador um respirador...). Além disso, minha visão sobre esses conceitos é bastante empiricista (diz respeito ao que são e como acontecem e não a uma especulação de como poderiam ser), o que me economiza uma multiplicidade desnecessária de termos, como normalmente ocorre com a eutanásia (ativa, passiva, direta, indireta, voluntária etc). A soma dessas duas posturas me leva a postular que: a) A eutanásia - onde ela é legalmente praticada - é um processo que inclui os cuidados paliativos, de modo que não podemos equacionar cuidados paliativos e ortotanásia em todos os lugares, mas apenas naqueles em que a eutanásia não é permitida; b) Nos lugares em que se permite e se pratica a eutanásia, essa não atenta contra a dignidade humana, mas a reforça, o que significa que ela tem o seu lugar ao sol; e, c) Os cuidados paliativos não são um fim em si mesmo, mas um meio de assistência aos moribundos, que em respeito à vontade desse e para não cair no paternalismo típico da distanásia, tem como obrigação moral considerar a possibilidade da eutanásia, de acordo com as leis de cada país.
No Brasil, a ortotanásia é a saída mais coerente com a nossa história e moralidade e os cuidados paliativos o modo mais seguro de garanti-la.
Ayala Gurgel