Na vida como na morte: o humanismo ausente na formação médica (Marco Antônio)

Nos meus vinte e cinco anos de profissão, mais os seis da formação em medicina, quando nos defrontamos com a morte logo nas primeiras aulas de anatomia, percebia nos colegas um comportamento dual que viria a se prolongar pelo resto das suas vidas e carreiras: alguns denotavam uma certa repugnância, evitando ao máximo uma maior aproximação com as peças anatômicas ou o prolongamento de seus estudos práticos com elas, muitas vezes expressando algum comentário, religioso, filosófico ou de cunho social, a respeito da suposta pessoa que ali se encontrava em forma de cadáver. Outros, na sua grande maioria, talvez pela situação de entusiasmo em ter galgado sucesso num curso tão concorrido e valorizado pela sociedade, encarava de forma indiferente, tratando como se fosse um material qualquer de estudos, muitas vezes até assumindo um comportamento jocoso e desrespeitoso, como em inúmeras histórias que conhecemos, tipo as de estudantes que simulam jogo de bola com crânios ou colocação de partes anatômicas, como o pênis, nas bolsas das colegas. Então... tal comportamento dual continua persistindo, significativamete, nas relações dos médicos com a morte e o morrer, consubstanciadas através de pacientes graves, em estado terminal ou não. Claro que a natureza da relação mudou no seu modo de expressão. Agora os médicos assumem as seguintes posturas: ou continuam indiferentes à situação em sí, dessa vez tratando como se fosse um acontecimento corriqueiro de trabalho, digamos um acidente, o que pode levar a uma negligência ou imprudência nos procedimentos protocolares de emergência ou assumem uma postura de inconformação e pesar, às vezes tão intensas, que podem induzir ao prolongamento inadequado desses procedimentos, igualmente prejudiciais ao paciente e ao seu momento de morte. A análise contida na sua explanação, trás à superfície do entendimento psico-social, algumas das explicações e razões para tais comportamentos, o que nos leva à convicção da necessidade preemente quanto à inserção, nos cursos de medicina, de disciplinas humanisticas que tratem do tema da forma tão esclarecedora, profunda e educativa, como foi nos repassado no texto. Marco Antônio Abreu Florentino Médico emergencista

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