O Recalque como Expressão Artística: A Morte como Objeto (Erasmo Ruiz)

O que está reprimido sempre busca formas de expressão. Não se trata de pensar esse conceito apenas como a psicanálise o faria mas pensarmos a semelhança de Nobert Elias, qual seja, no sentido de como o processo civilizatório em seu desenvolvimento busca (re)frear determinados comportamentos considerados inadequados para este ou aquele objetivo socialmente constituído. Óbvio que os indivíduos pagam seu preço por isso. No passado a repressão sexual, muito mais marcante, ajudava a constituir rico e diverso quadro de transtornos mentais. Mas, como todo recalque, a estética consagrava formas específicas de sua liberação. A arte, por excelência, sempre foi um mecanismo para tal. Basta pensarmos que é no auge da repressão vitoriana que encontraremos a beleza da estatuaria mortuária em suas transparências, expondo seios, mostrando contornos semi-encobertos. Ao visitar um cemitério mais antigo perceberemos com alguma boa vontade que morte e erotismo parecem produzir uma estranha e atrativa mistura. Mas não precisamos recuar tanto ao passado. Representações da morte comparecem de forma marcante na arte contemporânea. Será que a relativa excclusão social dessa temática produz o seu ncontrário, ou seja, favorecem com que o tema se torne especialmente atrativo? Como tudo que é recalcado, há sempre a exigência mais ou menos velada para sua expressão. Tradicionalmente as artes plásticas já trabalharam com modelos mortos, transformando-os em desenhos e pinturas. Noutras circunstâncas, mortos "pousam" como vivos, uma forma de "memento mori"que nega e ao mesmo tempo afirma a morte. Mas gostaria nesta, e em próximas postagens, explorar a radicalidade da morte enquanto obejto artístico. Em quê se constituiria essa radicalidade? Trata-se de sinalizar que, no limite, a própria morte, o corpo morto, os restos mortais, ossos, esqueletos, os instrumentos para produzi-la, enfim, as expressôes materiais da morte, como expressões materiais da realidade, podem ser transformados em objetos e conceitos artísticos, por mais que isso possa ofender sensos estéticos consolidados, até porque esse é um dos papéis da arte, funcionar com certo espírito de vanguarda e, volta e meia, contrapropor um novo olhar sobre o real. Queria por em destaque o trabalho de Lucinda Devlin, fotógrafa norteamericana que, com aguda percepção, nota que existiria uma suspeita semelhança entre os espaços de cura com os locais de execução de condenados a morte. No trabalho intitulado "Omega Suite" Lucinda expõe uma série de fotografias onde vemos cadeiras elétricas, salas de câmara de gás e recintos para injeções letais. Ela explora o domínio dos espaços interiores como marca da cultura americana e percebe essa marca também no terreno da morte. Lucinda mostra "mementos mori" típicos do nosso tempo, onde a cultura higienista atinge nossas vidas e regulam nossa morte, aconteça ela num hospital ou numa elaborada sala de execução. Ela não tem objetivo de questionar a pena de morte com o seu trabalho mas, claro, como arte, sua proposta ganha autonomia e assume novos significados para todos que dela usufruem. Embora não vemos nenhum homem nas fotos, é impossível não imaginar os virtuais sofrimentos psicológicos de quem irá se deparar com a morte sem subterfúgio alguum. Teria sentido essa barbárie revestida de aparato tecnológico e higiênico? A pena de morte não nos transformaria todos em assassinos na medida em que o Estado assume a função pública de matar em nosso nome? Deixo com vocês as imagens de Lucinda Devlin!

Um comentário:

Anônimo disse...

Sim, na arte a morte e o erotismo produzem estranha mistura. Cito por exemplo, uma banda de rock cujo nome e Sepultura. Os rapazes que compoem esta banda se vestem de preto, usam adereços em forma de caveira. Esta banda faz muito sucesso entre os jovens e tenham certeza que estes vem mais sensualidade que morte naqueles simbolos todos com os quais os bravos rapazes se apresenetam.
elba Gomide mochel