A Morte Como espetáculo: Sangue e Homicídios na TV (Erasmo Ruiz)


Pensava que era uma peculiaridade da cidade em que vivo. As estações locais de Tv competem entre si com programas que tema violência e a morte como chamarizes. Mas nos últimos anos em minhas andanças por outros locais do país comecei a perceber um certo padrão. A fórmula é largamente utilizada. Existe a figura de um âncora que dramatiza verbalmente o conteúdo já dramático das imagens. As câmeras acabam com o pudor da morte. Em passsado recente, as cenas de crime eram mostradas de forma ampla e irrestrita não importando muito o estado em que se encontrasse o cadáver. Muito sangue, eviscerações, o sofrimento e a indiferença das pessoas no entorno, a coleta de delcarçãoes de policiais e peritos. Recentemte, por força de medida judicial, há uma trucagem eletrônica que quase imediatamente desfoca o corpo, que agora é "narrado" pelo repórter, extremamente preciso em descrever o que está vendo. Diante de nós a massa sanguinolenta que vai sendo refocada em nossas mentes. O horário quase sempre é no entorno do almoço. Entre uma e outra garfada do rotineiro feijão com arroz, recebemos doses cavalares da estética de violência que acontece nas ruas. Sempre racionalizei meu interesse por este tipo de programa como especulação cienttífica. Mas existem outros componentes que explicam o grande sucesso e a ausência de receio dos patrocinadores em associarfem suas marcas com a presença de cadáveres ensaguentados. Como a morte e suas decorrências - o falar sobre ela e a sua visibildiade mais crua - ainda se expressa como tabu, esses programas cumpririam o papel de verdadeiras "revistas pornográficas da morte", onde o que menos interessa é o contexto biográfico dos dramas e sim sua visibilidade explícita. Mas raramente teremos a oportunidade de ver nestes "entretenimento mórbido" o crime passional na classe média mas sim o eterno ritual de dor e sofrimento da ausência de políticas de segurança pública e lazer para as camadas mais pobres da população. E é destes locais que vem o grosso da audiência, um enorme Brasil que não se vê representado em canto algum da produção cultural ou, quando se vê, percebe-se de forma caricata como a miséria e pobreza pouco convincente das novelas e filmes nacionais. A periferia que se vê sangrando em sua juventude, devorada pelo tráfico e pelo aparato repressivo, (re)vê parte do seu drama nos cadáveres silenciosos velados nas calçadas sob o patrocínio do remédio para prisão de ventre ou da loteria que sorteará R$ 120.000,00 no final de semana. Entre um bloco e outro de notícias, a voz indignada do locutor que acaba sendo uma espécie de para-raios da catarse de descontentamento de quem sabe a hora que sai mas que não sabe como chegará em casa. Será esse mesmo descontentamento que levará nosso locutor a ocupar um importante cargo eletivo, ele mesmo beneficiário da tragédia cotidiana e da super-exposição da morte despudorada durante o almoço. Vejam! No ar, mais um campeão de audiência da pornografia da morte, onde os que já morreram nos saúdam num patrocínio de remédios para tantas mazelas dos corpos dos vivos, com destaque para obesidade, constipações, varizes e homorróidas! Estamos lá, todos "saudáveis" a contemplar a morte na(da) perifieria no útero seguro de nossas salas. Quem sabe um de nós não ganhará na loteria?

3 comentários:

Mari disse...

Realmente essa escandalização da morte não é privilégio da sua cidade. Onde moro existe um jornal vendido pela bagatela de R$0,25, onde a notícia de capa, aquela que merece letras grandes e coloridas, deve trazer notícias de morte e quanto pior a situação maior a letra. Sempre me perguntei se por esse preço só se tinha direito à um obituário ilustrado,e realmente o q vc disse faz todo sentido.
Pelo andar da carruagem mais jornais de R$0,25 e ancoras de trajédias virão!

Daniel Alabarce disse...

é realmente isso que acontece e é realmente preocupante. Existe uma forma cruel de se obter audiência com este sensacionalismo.
É tal qual a produção em massa, tal qual a banalização da natureza tornada meio para satisfazer as necessidades sempre novas de seus consumidores compulsivos e esquizofrênicos.
A morte também pode ser utilizada como meio de lucratividade para quaisquer empresas e também para a mídia!

E a mídia é mesmo um reflexo da sociedade...

Daniel Alabarce disse...

ah, e eu gostei demais do seu blog, vou estar sempre por aqui! abraços