Poemas Mortais à Mulher Amada: Tanatologia Poética com Baudelaire (Erasmo Ruiz)

                                 Túmulo de Baudelaire
Agora a conversa é de homem para homem. Em algum momento da vida, lá pelo final da adolescência você, apaixonado pela mulher da sua vida, simplesmente não sabia o que fazer  para resolver a questão.

Numa hora como essa recorre-se aos amigos mais experientes, ao pai ou ao irmão mais velho, livros de autoajuda são bem vindos, internet...as opções são variadas.

E as respostas também são: "declara-se a ela"; "convide-a para ir ao cinema, de preferência um filme romântico e depois diga tudo o que está sentindo"; "mande flores com um pacote de chocolates" etc. Claro, se você possui dotes poéticos acima das rimas de "amor" com "flor" pode ter sido aconselhado a fazer um poema.

Hoje em dia não passaria pela cabeça da maioria dos mortais ao tentar seduzir o amor da sua vida, falar em morte. Mas que coisa de mau gosto! Ora, amor é algo que em tese oporia-se a morte, pois fala de vida, de libido, de paixão e de intensidade.

Mas numa época onde a morte era vista com outros olhos, mais presente e visível, menos interdita. Numa época em que as explicações gerais iam perdendo espaço para outras que colocavam em dúvida as certezas de uma pós vida e da eternidade, cabia então chamar à razão  aquela pobre dama que mesmo diante dos desejos do corpo, negava seus amores ao suplicante poeta.

Assim, temos Baudelaire num gesto absolutamente sedutor...pelo menos nos idos de 1857:


Remorso póstumo

Quando fores dormir, ó bela tenebrosa,
Num negro mausoléu de mármores, e não
Tiveres por alcova e morada senão
Uma fossa profunda e uma tumba chuvosa;

Quando a pedra, oprimindo essa carne medrosa
E esses flancos sensuais de morna lassidão,
Impedir de querer e arfar teu coração
E teus pés de seguir a trilha aventurosa,

O túmulo, que tem um confidente em mim
- Porque o túmulo sempre há de entender o poeta _,
Na insônia sepulcral dessas noites sem fim,

Dir-te-á: "De que serviu, cortesã incompleta,
Não ter tido o que em vão choram os mortos sós?
_ E o verme te roerá como um remorso atroz.
(Charles Baudelaire,"Les Fleurs Du Mal", Tradução de Guilherme de Almeida)

Caro Leitor! Se sentires que sua amada seja sensível a tais argumentações, então use e abuse da genialidade de Baudelaire. Mas creio que estas aproximações poéticass sobre a morte no século XIX seriam meio que incompreendidas pela maioria das mulheres de hoje em dia.
Particularmente, acho a idéia do túmulo ser um confidente do poeta a pensar na morte em noites de insônia muito representativa dessa época em que a tuberculose graçava sem controle convidando ao lirismo das metáforas sobre o efêmero. E coittado do verme cheio de remorso devorando a intensa beleza daquelas carnes sem vida. Chego a pensar que se Bauldelaire continuasse o poema expressaria inveja do pobre verme!

Mas deixando o sarcasmo para lá. O poema é lindo! Mas essa beleza soa meio incompreensível para os dias de hoje. A maioria das pessoas sonha em seduzir com  ícones do consumo, com o espetáculo do frenesi da vida chafurdando nos significados rasteiros do oceano de mercadorias.

Interessante captar as nuances de uma epoca onde a morte junto com o mel, as flores e o arco-iris, fazia parte do construto de metáforas que na verdade eram artimanhas para a exaltação da vida!

2 comentários:

iza disse...

O poema é maravilhoso. E o teu comentário muito interessante.

Vou te apresentar a um poeta que fala muito da morte: Júlio Saraiva. Está no facebook e é padrinho de meu filho.

beijos
Iza

Giane disse...

Aprecio Baudelaire e não é de hoje.
Mas esse poema, não conhecia.
E gostei.
Mas há muitos poetas que fazem da morte sua "musa inspiradora".
Augusto dos Anjos e esse aqui, por exemplo:

http://falliturvisiog.blogspot.com/

Beijos mil!!!