Morte e Imortalidade Na MItologia Grega: Sibila de Cumas (José Jackson Coelho Sampaio)


Entre as 10 grandes profetizas da antiguidade grega, sempre se destacou a Sibila de Cumas. Nascida em Éritras, na Jônia, numa caverna do monte Córico, de pai humano e mãe ninfa, a jovem, desde o nascimento, demonstrou possuir, com muita competência, o dom da profecia. 


Competência e originalidade, pois sempre formulava suas profecias em versos e as registrava. Acompanhando o sol da cultura grega, que já se afastava do leste do Mediterrâneo e se deslocava para a península itálica, ainda jovem a Sibila mudou-se para Cumas, cidade do litoral da Campânia, ao sul de Nápoles.
            Em Cumas a profetiza cresceu em feitos e fama até ser cognominada de Deífoba, isto é, semelhante às deusas. Conta-se que ela levou Enéias, príncipe troiano, para visitar Anquises, seu pai recentemente morto, nos territórios de Hades. Conta-se que ela foi ao rei romano Tarquínio, o Soberbo, no século VI aC para lhe oferecer, por um preço altíssimo, nove livros de suas profecias organizadas, mas o rei barganhou e ela destruiu três livros, re-ofertando os seis restantes pelo mesmo preço, o rei barganhou novamente e ela destruiu mais três livros, re-ofertando os três últimos pelo mesmo preço original. O rei, desesperado, comprou os três Livros Sibilinos restantes pelo preço que, no início, pagaria os nove. Conta-se que o original destes livros foi destruído no século I aC e que suas últimas cópias desapareceram no século V dC. Assim a Sibila de Cumas teria vivido, no mínimo, da Guerra de Tróia ao período dos sete Reis Romanos. O poeta Virgílio conta que a Sibila de Cumas profetizou o advento do triste deus cristão, aquele que é traído, agoniza, morre, ressuscita e inventa o pecado e a culpa. O que explicaria tanta longevidade?
            Em Cumas é que Apolo, o deus das profecias, a procura, a encontra, não esconde a admiração e a deseja. Mas, mesmo sabendo-se amada por Apolo, a Sibila se sabia humana, sujeita ao envelhecimento e à morte, e que seria mais um caso na parábola do deus. Ela então escolhe ser a sumo-sacerdotisa do deus, não a amante do deus e pede a ele um dom: diante do deus ela toma, no côvado das mãos, toda a areia de praia que pode segurar e diz querer viver tantos anos quantos grãos de areia houver ali. O deus não discute: será muito bom para ele tê-la por mais tempo, cuidando de seus templos, falando por ele para ajudar estes loucos humanos, enfrentando os estranhos novos tempos que pareciam estar na soleira. O deus não discute e lhe concede nove vidas de 110 anos, a medida mais longeva da vida humana, isto é, lhe concede 990 anos de vida. Este número representa o símbolo de uma longevidade mítica.
            Mas a Sibila esquecera um detalhe, detalhe de todo indiferente ao deus. Sibila não pede a permanência da juventude e então ela encolhe, emurchece, transforma a pele num pregueado de lama esturricada. Somente os olhos e a voz permanecem potentes. Conta-se que, para que o vento não a carregue e os animais domésticos não a devorem, ela é posta dentro de uma gaiola, ser de crostas escuras, mãos encarquilhadas, uma cigarra vinda das profundezas da terra e do tempo e que continua, com seus olhos potentes, a compreender o mundo e, com sua voz potente, a antecipar as sinas. Todos, em volta, morrem. Só a Sibila de Cumas não morre. Cem anos, trezentos anos, oitocentos anos, até a dor já passou além da dor, e a Sibila de Cumas não morre. 
            Conta Ovídio que, nas noites quentes da Campânia, as crianças ouviam a voz potente lamentar sua longa e velha vida. E as crianças, em algazarra, perguntavam: Sibila, o que anseias? E, em meio aos mais pungentes lamentos, a voz sussurrava, cava,: Ah, eu, anseio morrer.

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