O Mito de Aurora e os Moribundos: Até Quando Adiar a Morte? (Dario Junior*)



Ao nascermos temos por companheira inseparável a iminência da morte. Não vivemos pensando em como ela chegará, mas, um dia, ela sempre chega; não fazendo distinção entre ricos, pobres, brancos, negros, todos vão morrer. 

            Os avanços da medicina proporcionaram aos indivíduos o conhecimento de muitos dos processos que ocasionavam a morte, entretanto, ao passo que alguns dos segredos desta senhora são revelados sua presença é retirada da sociedade, um estranhamento que gestou um verdadeiro tabu. Não falamos sobre a morte, fingimos não saber que um dia ela irá chegar, colocamos nossa esperança em uma medicina que, algumas vezes, vende a vida e juventude eternas, tomando a morte como sua grande inimiga,  tendo o mito de Asclépio como paradigma, pois este conseguia fazer as pessoas voltar do mundo dos mortos.
            Muitos médicos tomam por incumbência lutar contra a morte, mesmo que esta se apresente de uma forma natural. Para que esta luta? O mito de Asclépio é utilizado de uma forma alegórica: da morte que pôde ser evitada. Contudo, tantos outros proporcionam uma visão sobre o processo de morrer: uma forma de fechamento, de conclusão necessária para os vivos.
Dente os mitos relacionados à morte temos o da deusa Aurora. Esta roga ao Pai dos deuses que conceda a seu amante a vida eterna. Pedido atendido pelo senhor do Olimpo. No entanto os anos passam, a deusa permanece bela e seu formoso amante apresenta um aspecto decrépito, não estando contente com sua virtual imortalidade.
            Será que o amante ansiava tornar-se imortal, ou Aurora, para não ficar sem ele o amaldiçoou, tendo a melhor das intenções, com a imortalidade?
            Durante a guerra de Tróia, Zeus, o senhor dos deuses, chora a morte de um de seus filhos na guerra, pois, nem ele, poderia mudar o destino que a moira traçou.
            Muitos profissionais de saúde tomam Thanatos como grande inimigo. Contudo, será que quando agem assim pensam no que será melhor para seu paciente, ou, assim como Aurora, para não perder (falhar) com um paciente o impedimos de seu inevitável e, por vezes, desejoso encontro com Thanatos, em uma luta em que até o senhor mais poderoso do Olimpo não pode advogar, muitos profissionais advogam, não pelo bem de seus pacientes, mas neles personificados em troféus, o “senhor da vida”, que se esquece do detalhe de também ser mortal.
            Ser um profissional de Saúde, não é empreender uma luta Sísifa, na qual lutaremos contra a morte a todo custo, mas lutaremos por uma vida que valha a pena ser vivida, pois, caso contrário, poderemos do mesmo feitio que Aurora proporcionar que as pessoas de que cuidamos consigam uma vida sem qualidade apenas para como uma resposta aos nossos anseios e questões a respeito da morte.
            Se lutarmos pelo direito de viver, também deveremos lutar pelo direito de se morrer com dignidade.

*Dario Junior é Acadêmico de Psicologia da Universidade Estadual do Ceará (UECE)

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