Rede Globo de Televisão fala, no Jornal Hoje, sobre Direitos Sociais dos Moribundos
MANIFESTO AOS PADEIROS
A Morte Pode ser Engraçada!
Deixo com vocês dois pedacinhos do filme "O Sentido da Vida" do grupo inglês "Monthy Python". Eles adoram satirizar nossos mais "sólidos" valores e, neste filme, saem em busca da resposta para a tradicional pergunta: "qual é o sentido da vida?". Prestem a atenção sobre a esquete dos peixes no aquário do restaurante e, em seguida, uma animação musical sobre a pergunta do filme: IMPAGÁVEL!
A Doença da Ministra, a Morte e Nossa Humanidade (Erasmo Ruiz)
Podemos ficar vendo televisão e nos emocionarmos com uma novela. Nenhuma falta grave, afinal, a vida nos condiciona a termos determinadas reações. Sou do tipo "manteiga derretida", meio sensível a qualquer melodrama. Uma parte de mim execra este tipo de manifestação cultural, atira ferozmente contra o reino dos clichês, revolta-se contra o filme sobre o pai que leva o filho com os dias contados para um parque de diversões. O roteirista coloca a cena com o objetivo de nos arrancar lágrimas na marretada e, de fato, quase sempre acaba conseguindo. Mas outra parte de mim entrega-se a proposta do enredo e, sem vergonha alguma, chora copiosamente.
Parece que sempre dá certo. Do teatro passando pelo cinema e desaguando nas novelas, as pessoas ficam meio que abertas às lágrimas tidas como fáceis. Podemos acessar nossas mentes e, feito computadores atrás de arquivos perdidos, encontraremos muitas explicações do porque dessas lágrimas correrem feito cachoeira. Nunca descobriremos efetivamente porque José de Arimatéia chorou ao ver o sofrimento da personagem de novela que estava morrendo de câncer ou porque Maria da Glória debulhou-se em prantos ao ver o noticiário sobre a morte do Papa. Mas podemos intuir uma "abstração do melodrama", uma "teoria geral da lágrima".
Eu não me atreveria a perturbar o leitor com tal ousadia. Essa tarefa deve estar a cargo de críticos de arte, dos filósofos profissionais, dos sociólogos e antropólogos da subjetividade e da emoção, de alguns psicólogos que afogados em tanta soberba exigem o monopólio do estudo do comportamento humano. Um dia, quem sabe, o acúmulo de conhecimento resolverá a pendenga se vivemos como uma barata esmagada pela indústria cultural ou se existe uma imanência humana em relação a dor ou ao sofrimento. No entanto, permito-me a uma constatação singela. As pessoas se interessam tanto pela morte na mídia porque, talvez, sintam e discutam a partir da fição e da realidade o próprio morrer pessoal. È a mídia com seu conjunto de imagens pasteurizadas e seus assuntos programados nosso pobre e principal canal de interlocução com a morte e seus desdobramentos existenciais
A morte parece ser a "nova pornografia", o assunto proibido, o tabu que se encastela nesse novo milênio que nos acena com as possibilidades irrestritas do conhecimento científico: "Acabará a fome da Humanidade" dizem alguns, "Viveremos em grande conforto" dizem outros, "acabarão as doenças" profetizam outros tantos. Mas, a verdadeira ilusão é aquela que afirma: "gozaremos da imortalidade". Esta afirmativa, já posta desde a Epopéia de Gilgamesh*, nos tornam seres absolutamente preocupados com a questão da morte e do morrer o que nos leva, necessariamente, a refletir sobre a própria vida a ponto de alguns transformá-la no mais absoluto tormento. O medo de morrer transforma-se no medo de viver. Neste sentido, olhar a tragédia dos personagens dos filmes ou da vida real pode inspirar as pessoas a produzirem o azedume de misturar vida e ficção muitas vezes dando roupagens de realidade a uma peça ficcional
Talvez por isso tantos choram, talvez por isso as redações dos jornais e os autores de novela, consciente e inconscientemente, transformem a morte do outro em mercadoria para aqueles que são incapazes de pensar diretamente a própria morte, porque agir dessa forma poderia significar constatar, ainda em vida, a miséria existencial onde maioria de nós se encontra...miséria de ausências de alternativas, de vínculos afetivos artificiais, de trabalhos penosos e vazios de conteúdo. Nossa sociedade é repleta de objetividade, tem obsessão por medidas que aprofundam o conhecimento da natureza mais parecem produzir uma cultura da superficialidade da individualidade inserida na vida coletiva. Dai a necessidade de gráficos precisos para localizar as células cancerosas do astro do rock, dai ficarmos grudados na tela acompanhando o andar cambaleante de um pobre Marlon Brando já no fim da vida escoltado por “paparazzis”, dai a fixação por filmes de terror. Tudo isso permite nos aproximarmos da morte sem de fato refletirmos sobre ela em nossas vidas!
Não podemos mais discutir o que está interditado, não estamos mais preparados para enfrentar a morte a não ser como produto de consumo e, como tal, um produto que vai gradativamente submetendo-se à ditadura dos rótulos massificados e massificadores. Sejam bem vindos ao mundo da mercantilizaçao da morte e do morrer!. Sejam de fato o que todos são, comportem-se como coisas, como produtos que podem ser trocados ao bel prazer dos desejos da mão invisível. Nietzsche estava errado, deus não morreu, ele existe e seu nome é Mercado! Como um Midas invertido, que transforma ouro em excrementos, a mão invisível nos esfrega a tragédia da morte na mídia porque o segundo de publicidade ficará mais caro. Os jornais nos guiam aos labirintos das meninges do astro do cinema porque querem vender mais, não por solidariedade à tragédia de um ser humano.
Agora, a bola da vez é o câncer da ministra Dilma. Indecorosamente somos expostos a análises de conjuntura onde o futuro desse país está nas mãos de um linfoma. Curiosamente, milhões de pessoas estão diante das telas para aprenderem noções básicas de oncologia e sucessão presidencial. Transformaram a saúde da ministra em análise de conjuntura. Uns dizem que tudo é mentira para humanizar uma pessoa fria e sem carisma. Outros exaltam a fibra e a coragem de uma mulher que publicamente enfrenta seu câncer. Ora senhores, por favor, guardemos um certo nível de compostura sobre a dor, o sofrimento e a morte...sim...pois é isso que sempre passa pela cabeça das pessoas quando ouvem que alguém tem “aquela doença". Deixemos de hipocrisia!
Será que vendedores de jornais e seus leitores não aprenderam ainda que a dor, o sofrimento e o morrer do outro também é o nosso morrer? Como dizia o poeta Cazuza: "Senhoras e Senhores, trago boas novas, eu vi a cara da morte e ela estava viva!". Façamos o jogo das análises políticas. Nele, a vida e a morte sempre se digladiaram. Mas nesse tabuleiro, como todo jogo, há que se existir algumas regras. O homem vivencia uma luta sem quartel ha pelo menos cem mil anos pela definição destas. Muito já foi feito desde que Marx, o velho profeta ateu, constatasse na segunda metade do século XIX que o homem estava adentrando em sua pré-história.
Depois de duas guerras mundiais, depois de campos de extermínio e agora quando o extermínio de crianças em Dafur invade nossas salas ditas de estar pela TV, talvez uma regra fundamental possa ser firmada, qual seja, que a tragédia pessoal de todos nós - o enfrentamento com determinação, alegria, dor e ponderação do fenômeno da morte - possa ser minimamente respeitado, seja naquilo que um personagem de filme possa evocar, seja naquilo que um ser humano real e concreto nos sinaliza. À Ministra Dilma Rosseti , todas as críticas positivas e negativas que nós como cidadãos, agentes ativos da construção da história, podemos e devemos fazer. Ao ser humano Dilma, a solidariedade de todos nós, gladiadores da vida, pois, como eles diziam na Roma antiga: “Aqueles que vão morre te saúdam” Ministra!
ERASMO RUIZ
* Mito sumério provavelmente relatado por volta do quarto milênio antes de cristo. Neste mito, a principal força movente do heroi é a busca de uma erva que possa lhe proporcionar a imortalidade
Curso Multiprofissional em Cuidados Paliativos
Avaliação da dor em Cuidados Paliativos (Maria Goretti Maciel)
Simpósio de Bioética Hospitalar em São Paulo
A dor crônica no contexto dos Cuidados Paliativos (Maria Goretti Maciel)
Artista inglês recria morte macabra de heróis dos desenhos
Por mais que tente, o gato Tom nunca consegue se livrar de seu inimigo eterno, o rato Jerry. Essa é a 'ordem natural' dos desenhos animados, mas o artista inglês James Cauty resolveu subverter essa regra em sua nova exposição na Aquarium Gallery, em Londres. Em uma série de quadros, ele recria o que aconteceria se os personagens animados tivessem, finalmente, um fim trágico. Na imagem acima, sobrou para Jerry e para o passarinho Piu-Piu, devorado por Frajola. (Foto: Divulgação)
O gato Tom também acaba mal, assim como Pernalonga, finalmente superado pelo Patolino. (Foto: Divulgação)
Leia mais em:
http://g1.globo.com/Noticias/PlanetaBizarro/0,,MUL783666-6091,00.html
Delivery no Canadá oferece refeição de condenados à morte
"Menina de Ouro" e "Mar Adentro": Por que tantos querem a Eutanásia? (Erasmo Ruiz)
Creio que muitos de vocês devem ter visto pelo menos um dos filmes. Boa parte talvez tenha visto os dois. "Menina de Ouro " e "Mar Adentro" são bons filmes. Não vou me delongar numa crítica de cinema pois esse não é o objetivo. Reservadamente posso dizer porque gosto mais de "Mar Adentro" apesar de achar "Menina de Ouro" um ótimo filme
Venho até aqui colocar em discussão não os filmes mas tentar "descobrir" porquê fizeram tanto sucesso. O que os dois tem em comum é a narrativa de indivíduos que lutam para que lhe seja aplicada a eutanásia ativa. Ramon San pedro (personagem de Mar Adentro) parece ter uma postura mais cidadã: quer que seu caso se transforme numa problemática nacional para que uma legislação sobre a eutanásia e o suicício assisitido seja instituída. Na melhor tradição americana, em "Menina de Ouro" o problema social é reduzido a realidade de dois indivíduos onde a garota boxeadora que se tornou tetraplégica implora ao seu treinador que ponha termo a sua vida como um gesto de amor.
Mas o que os dois filmes teriam em comum além da tetraplegia dos personagens e suas lutas pela eutanásia? Durante os dois filmes os espectadores são chamados a compartilhar da dor dos perosnagens. Lá pelo final estamos quase prontos, ao sair do cinema, para entrarmos numa ONG qualquer que lute pela morte digna e pela autonomia irrestrita do ato de morrer.
Os personagens nos convidam a refletir sobre nossas própria vidas. Se estivéssemos vivendo suas condições o que faríamos? Confesso a vocês, talvez me irmanasse a luta deles e quisesse morrer. O problema básico é que, nas condições em que estão, precisam da ajuda de outros seres humanos para tal.
Por que se fala tanto em eutanásia hoje em dia? Uma metáfora interessante seria pensarmos na luta entre dois povos. Um, bem equipado militarmente, o outro, com armamentos de qualidade muito inferior, aquilo que os especialistas militares chama de "guerra assimétrica", onde o mais fraco usa de recursos heterodoxos para enfrentar um adversário muito mais poderoso. O mais fraco será apelidado nos noticiários de "terrorista".
Existe hoje uma guerra de concepções sobre como os homens devem morrer. A hegemônica afirma que nossos corpos devem se disciplinar bem comportados diante dos ditâmes do biopoder, em conlúio direto com aqueles que amamos. Significa dizer que existem indivídiuos que fazem parte um corpo técnico/cultural, os TANATOCRATAS, que quase determinam quando e de que forma iremos morrer.
É a percepção de que sofremos além do limite de nossas possibilidades físicas e mentais que alimenta o desejo pela eutanásia ativa. Para fugir do controle daqueles que nos controlam na hora da morte, parte de nós quer determinar com clareza o momento em que iremos sair do palco desse mundo. A luta pela eutanásia é a luta desigual entre o desespero e as normas que controlam o que "temos" de fazer e passar nesse mundo para morrermos
No entanto, há alternativas diante dessa dicotomia. Se as pessoas vissem desde crianças que existem outras possibilidades de se morrer do que aquelas comumente apresentadas...de que podemos morrer fora de UTIs, de podemos estar nem que parcialmente no controle de nossas ações até o fim...de que existem tecnologias e dispositivos que podem controlar a nossa dor e que equipes de profissionais de saúde podem ser preparados para lidar com nossa morte nos encarando nos olhos e não fugindo das perguntas, então... para que a eutanásia se poderíamos tentar aproveitar a vida até o fim?
Os cuidados paliativos são o melhor antídoto contra a luta desesperada e negadora da vida que a eutanásia inadivertidamente pode representar!
Cuidados Paliativos: Recursos na Internet
Disponibilizo neste blog recursos na internet sobre cuidados paliativos. Existe muita controvérsia e desinformação a respeito dessa temática. Como a ênfase da formação dos profissionais de saúde é de base terapêutica, existe uma cultura que percebe nos cuidados paliativos uma prática "menor", um "tapa buracos" ou, como dizemos aqui no Nordeste, uma "gambiarra" quando não se pode "fazer mais nada" pelo paciente. Diante do desamparo produzido pelo saber tradicional ,pode prevalecer a atitude da obstinação terapêutica que produz a ilusão de que algo está sendo feito mas, infelizmente, na maioria das vezes, o que a obstinação faz não são "milagres" mas sim a morte imersa em dor, desamparo e desconhecimento. Abaixo links em lingua portuguesa e estrangeira que oferecem um panorama sobre a temática.
Recursos em Língua Portuguesa
http://www.cuidadospaliativos.com.br/inicio.php
http://www.historiamedicinapaliativa.ubi.pt/
http://www.fau.com.br/pidi/inicio.php
http://www.casadocuidar.org.br/
http://www.oncoguia.com.br/site/index.php
http://www.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=474
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/inca/manual_cuidados_oncologicos.pdf
http://www.alexandracaracol.com/ficheiros/cuidadospaliativosetanatologia.pdf
http://www.inca.gov.br/rbc/n_48/v01/pdf/opiniao.pdf
http://www.scielo.br/pdf/pusp/v14n2/a09v14n2.pdf
http://www.praticahospitalar.com.br/pratica%2048/pdfs/mat%2018.pdf
http://www.fw2.com.br/clientes/artesdecura/revista/musicoterapia/monog_lizandra.pdf
http://www.alzheimer.med.br/masnoticias.pdf
http://www.scamilo.edu.br/pdf/mundo_saude/32/03_Novas%20pers.ectivas%20cuida.pdf
http://www.portalmedico.org.br/revista/bio1v4/distanasia.html
Recursos em Línguas Estrangeiras
http://www.cuidadospaliativos.org/
http://www.paliativoscanarias.org/
http://www.palliativecare.org.au/
http://www.secpal.com/index.php
http://www.stchristophers.org.uk/
http://www.helpthehospices.org.uk/
http://www.epec.net/EPEC/webpages/index.cfm
http://www.rwjf.org/pr/product.jsp?id=20938
http://www.federaciocristians.org/Metges/Buscar/10_eutanasia/05.05_sedacio_porta.pdf
Sessão Averroes de maio exibirá filme japonês
Mulher volta à vida durante seu próprio velório no Peru
Pesquisa sobre o significado moral da eutanásia na visão do profissional, do moribundo e dos familiares
Exposição com cadáveres gera polêmica na Alemanha: É possível fazer sexo após a morte?
Vamos continuando a explorar esse filão complexo da inter-relação entre arte e morte. Sempre presente desde as cavernas de Altamira, essa relação ganha novos aspectos antes não previstos. Se na pintura e na literatura essa associação fazia parte no passado de uma "ars moriendi", hoje, dado o afastamento coletivo do reflexão existencial sobre a morte, tende a aparece como algo bizarro e, como tudo que é reprimido (em parte semelhante a sexualidade), acaba por chamar a atenção. E falando da associação entre sexo e morte, parece que o anatomista Gunter Von Hagens demonstrou que essa possibilidade existe num plano até então não pensado. Inventor de uma revolucionária técncia de preservação de cadáveres, ele tem rodado o mundo apresentando uma exposição um tanto exótica por mostrar cadáveres que se "comportam" como se estivessem vivos. A notícia abaixo fala um pouco sobre isso e, principalmente, da polêmica de se colocar dois cadáveres fazendo sexo. Seria uma forma nada sutil de negação da morte? Ou artimanhas do inconsciente colocando Eros e Thanatos mais próximos do que a maioria deseja? No final, disponibilizamos links para que você possa fazer sua visita virtual e tirar suas conclusões. E ai, quem gostaria de ser um participante "ativo" dessa exposição?
Exposição com cadáveres gera polêmica na Alemanha
Gunther von Hagens |
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O projeto "Body Worlds" (mundos dos corpos), do anatomista alemão Gunther von Hagens, que vinha provocando polêmica em vários países por causa do uso de cadáveres na concepção de obras de arte, abre nesta quinta-feira uma exposição em Berlim que reproduz uma cena de sexo. "Nossa exposição se chama O Ciclo da Vida, e nela mostramos tudo, desde a concepção até a morte", justifica Von Hagens. "Morte e sexo são temas tabus. Eu coloco os dois juntos. A morte faz parte da vida, e sem sexo a vida não existe."
Segundo ele, as pessoas cujos cadáveres foram utilizados na obra jamais se conheceram quando vivas, tendo sido unidas uma à outra postumamente. No processo de conservação desenvolvido por Von Hagens, conhecido como "plastinação", os cadáveres são tratados com cerca de 200 quilos de silicone, durante um complicado procedimento que levou mais de quatro mil horas para ser concluído.
Gunther von Hagens garante que os doadores permitiram por escrito que seus corpos fossem expostos simulando um ato sexual. O homem teria morrido aos 51 anos de câncer pulmonar, e a mulher, aos 58 anos."Nos formulários de doação, dois terços dos homens e um terço das mulheres se concordaram que seus corpos fossem usados para representação de um ato sexual."
Gunther von Hagens |
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Visita à Exposição De Arte e Animais Mortos
Instigado pelo Post de Ayala Gurgel resolvi achar fotos da referida exposição. E não é que eu encontrei? A arte muitas vezes nos apresenta desafios. Particularmente tenho uma certa dificuldade de ser vanguardista em arte. Na verdade, só gosto dela quando fica um tanto envelhecida e, dessa forma, deixa de ser vanguarda. Abaixo as fotos para, quem sabe, deleite de alguém.

Câncer: pacientes têm direito a benefícios legais (Carolina da Gama)
Animais mortos viram obras de arte em exposição chocante na Inglaterra
"Quero Morrer Dormindo" (Erasmo Ruiz)
Ministro "Introdução à Tanatologia" na Universidade Estadual do Ceará desde 1999, para os cursos de Enfermagem e Serviço Social. Logo no primeiro dia de aula especulo dos alunos sobre os motivos de estarem ali, afinal, a morte não é um dos assuntos mais populares embora paradoxalmente esteja tão em evidência na mídia.
Ame e deixe Morrer
Eutanásia e Cesariana (Ana Carolina)
A Morte como Mercadoria: Aproximações Psicossociais do Produto Funerário como Bem Econômico (Erasmo Ruiz)
Aprendemos desde a mais tenra infância que o comportamento de consumo deve estar associado ao prazer, em parte, desfrutado pela assimilação da mercadoria como valor de uso. Compartilhamos da ilusão de que somos livres consumidores que escolhem livremente o que comprar. Já que o dinheiro é uma mercadoria muito ansiada e rara, o fato da maioria de nós não o possuir em grande quantidade faz com que realizemos as pesquisas de preço buscando consumir mais com menos dinheiro.
Aqui, um primeiro impasse em relação ao consumo de serviços funerários se apresenta. Não queremos conviver com a morte. Mas quando ela acontece, temos obrigatoriamente que consumir produtos que não desejamos, temos que realizar escolhas que não queremos. A forma como lidamos com a mercadoria “produtos funerários” é, portanto, esvaziada das formas significadoras que aprendemos a usar em relação aos gestos de consumo. Poucos teriam a visão prática, por exemplo, de fazer uma pesquisa de preço para buscar a urna funerária mais barata, a coroa de flores mais em conta, o velório menos dispendioso. Além disso, os produtos funerários não estão dispostos em out-dors ou podem ser vistas em glamorosas publicidades de revistas de grande circulação.
Diante da pergunta se venderíamos ou não um irmão, ela parece soar estranha e bizarra. Com certeza porque as relações familiares ainda não se renderam a lógica da mercantilização. É uma sensação similar que temos quando lidamos com a morte e seus aspectos econômicos. Não estamos habituados a comprar aquilo que não queremos. Quando consumimos, queremos utilizar as coisas pela sua beleza e prazer. Instaura-se uma relação em que, no lugar do desejo hedônico, existe o ódio e o sofrimento. Intuindo essa tensão, as empresas funerárias mudaram há alguns anos sua estratégia de marketing. Se antes estávamos acostumados àquelas funerárias em torno dos hospitais, com urnas expostas nas calçadas, agora nossa sensibilidade expressa a necessidade de consumir os produtos mortuários na ausência de sua visibilidade. As empresas em seu “layout”, começam a se assemelhar à agências de turismo. Seus nomes sinalizam “tranqüilidade”, “carinho”, “cuidado”, refletindo a necessidade de se atuar e se falar sobre a morte como se ela não existisse.
O atendimento, em particular quando voltado as classes médias urbanas, vende o produto funerário como se estivéssemos num agência de automóveis. Cada novo aparato num funeral é como se fosse um “opcional”. Detalhes como o tipo de bebida e comida a ser oferecido para as pessoas que comparecem ao velório bem como se haverá ou não veículo coletivo para buscar convidados num aeroporto ou leva-los a um cemitério, são itens a serem possivelmente consumidos. Os funcionários são treinados para mostrar sempre uma postura respeitosa e cordata. Falas como “volte sempre” e “foi um prazer servir você” tornam-se expressões inaceitáveis. Na mídia, os produtos funerários oscilam entre mensagens sérias e respeitosas, ou então, são associados a situações cômicas. O sagrado é afugentado por um profano cada vez mais estruturado a partir das relações de troca. Entretanto, o limite parece ter sido atingido por uma empresa italiana de produtos funerários, que disponibiliza em seu sítio na internet, entre muitas coisas, um conjunto de calendários com mulheres sensuais associadas a caixões. A foto abaixo é um dos muitos exemplos:
vide cofanifunebri
Um novo olhar sobre o lema "Carpe Diem" dos romanos? Um convite para uma sexualidade desenfreada porque um dia iremos morrer? Nem tanto. Apenas a constatação mercadológica de que a maioria dos indivíduos proprietários de empresas funerárias são homens e, semelhante ao que acontece com outros produtos com a marca da masculinidade, explora-se o viés machista de seu público. Neste sentido, sob o prisma econômico, camisetas, cervejas, carros, futebol e urnas funerárias, chafurdam na mesmice das relações de troca mediadas pela mercadoria dinheiro.
Em outra vertente, numa sociedade que patologiza a morte como algo antinatural, torna-se necessário expandir os serviços médicos oferecidos por uma medicina cada vez mais escravizada frente ao aparato tecnológico, nem tanto pelo paradigma da promoção de saúde, mas, principalmente, pelo paradigma que vê na morte uma eterna inimiga, a doença em si mesma. Se por um lado o discurso médico sinaliza que a morte e o morrer podem estar subordinados a soluções científicas, essas mesmas soluções são vendidas como mercadorias que promovam a saúde. Aqui promover a saúde significa negar a morte. Este talvez seja um dos aspectos que intensifiquem a exclusão social da velhice. O velho sempre nos lembra que ele é o novo lócus da morte. Daí, portanto, a mercantilização do nosso medo de envelhecer transmuta-se no crescimento vertiginoso do esteticismo, das cirurgias plásticas e do consumo de cosméticos. Antes de se parecer com jovens, as pessoas na verdade querem neuroticamente negar a própria finitude. No capitalismo não só são mercantilizadas as práticas objetivas em torno da morte, mas também nossas sensações psicológicas de medo e afastamento.
Por fim, temos que destacar um outro aspecto importante. Se em toda a sociedade o acesso às mercadorias produzidas bem como ao usufruto da riqueza delas advinda é desigual, o mesmo podemos dizer referente a mercantilização da morte. Toda hora somos bombardeados por notícias que nos permitem o direito ao otimismo. O “admirável mundo novo” de Huxley está diante de nós. Abandonou o papel e ganhou materialidade, inclusa suas contradições. Se a média de vida aumenta, quem de fato vive a média de vida se a maior possibilidade de acesso aos bens materiais e simbólicos parece ser um fator decisivo referente à quantidade e qualidade dos anos que vivemos? Frente as mazelas da fome e da miséria um arsenal de instrumentos se revelam eficazes, mas o que fazer se a sociedade mercantil parece preconizar o uso dessas técnicas muito mais em função do valor de troca? Isso nos permite afirmar que, aparentemente, vivemos numa sociedade que preconiza uma “engenharia da morte”.
Este talvez seja o aspecto mais apavorante da mercantilziação do morrer, pois estar à margem do mundo das possibilidades de consumo significa, em maior ou menor grau, ter mais chances de morrer cedo, mal assistido e com sofrimento. É para fugir desse mundo de horrores, de um sistema de saúde que atenda de forma desigual e excludente, que a classe média deságua nos planos de saúde. Ironicamente, são nesses planos que a mercantilização da vida e da morte podem ser mais claramente aferidos. Ai daquele cujo corpo necessite de exames e outros procedimentos não cobertos pelo plano. Sua morte estará decretada. Ai daquele que necessite permanecer mais tempo na UTI, sua execução será sumária. Pobre do homem que precisar fazer outra tomografia computadorizada antes que o tempo para tal possa novamente ser contado. O plano de saúde, como qualquer prática de compra e venda, é regulado por um contrato comercial. Só percebemos isso quando nossos corpos rebeldes recusam-se a subordinação de leis de mercado e “quebram” regras contratuais. Chegamos assim ao limite da coisificação quando as ações de seres humanos frente a outros seres humanos, com vida diretamente ameaçada, estão sujeitas a normas burocráticas, parágrafos e clausulas regulatórias, expressões diretas da lógica advinda da “mão invisível” que esquadrinha corpos e práticas, reduzindo o homem àquilo que ele é, de fato, no capitalismo: uma mercadoria que além de agregar valor pode, como qualquer mercadoria, ser usada e vendida.
Aqui finalizamos nossas digressões. Para comprova-las, ou não, basta a ida ao mundo cotidiano, pulsante de ação e vida. É o que pretendemos no futuro. No momento, fiquemos na companhia de Manuel Bandeira:
Quando o enterro passou
Os homens que se achavam no café
Tiraram o chapéu maquinalmente
Saudavam o morto distraídos
Estavam todos postos para a vida
Absortos na vida
Confiantes na vida.
Um no entanto se descobriu num gesto largo e demorado
Olhando o esquife longamente
Este sabia que a vida é uma agitação feroz e sem finalidade
Que a vida é traição
E saudava a matéria que passava
Liberta para sempre da alma extinta.
Não sei se a vida é traição, mas pensar na morte nos faz refletir muito sobre a vida. Talvez ai resida uma das tristes conseqüências da mercantilização da morte e do morrer. A reificação do luto e da dor nos narcotiza frente às questões mais importantes e que, respondidas, exigem resoluções que não são meramente discursivas, mas também atuantes. Nosso ser agnóstico muitas vezes se debate frente à possibilidade do fim como algo absoluto. Não queremos contaminar o leitor com divagações depressivas. Fica, no entanto, o lembrete que a mercantilização da morte é uma das conseqüências da mercantilização da vida. A reificação das práticas e rituais em torno dela produzem essa ação maquinal habilmente descrita pelo poeta. Volta e meia podemos, além da opacidade da sociedade mercantil, olhar a morte pelo que ela tem de mais importante e, por que não dizer, lírico. A morte é uma exímia professora que nos ensina que tudo é transitório e, assim, nos ajuda a revestir todos os aspectos da vida com a sua real importância, estruturada por eventos singulares e preciosos.



